O Direito de Construir e seus Limites
- Thales de Menezes
- 8 de mai.
- 4 min de leitura

A construção de edificações em terrenos particulares é um dos principais exercícios do direito de propriedade. No entanto, esse direito não é absoluto. O artigo 1.299 do Código Civil estabelece uma regra fundamental para equilibrar a liberdade do proprietário com os direitos dos vizinhos e com as normas urbanísticas impostas pelo poder público. Veja o que diz o dispositivo:
Art. 1.299 – O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos.
Essa norma, embora curta, é extremamente relevante na prática. Ela regula a atuação de quem deseja construir e impõe limites claros ao exercício do direito de propriedade, principalmente em áreas urbanas. A seguir, explicamos como esse artigo funciona, quais são os seus principais efeitos e o que deve ser observado antes de iniciar qualquer obra.
1. O direito de construir no próprio terreno
O ponto de partida do artigo 1.299 é simples: todo proprietário tem liberdade para construir em seu terreno, de acordo com seus interesses. Essa liberdade está relacionada ao princípio constitucional do direito de propriedade (art. 5º, XXII, da Constituição Federal) e ao conceito de que o dono do bem tem o direito de usar, gozar e dispor daquilo que é seu (art. 1.228 do Código Civil).
Assim, o proprietário pode, em tese, construir uma casa, ampliar um galpão, levantar um muro ou até mesmo demolir e reconstruir um prédio. No entanto, esse direito não é ilimitado. Ele deve respeitar os direitos dos vizinhos e as normas administrativas, como deixa claro o próprio artigo 1.299.
2. O respeito aos direitos dos vizinhos
Ao permitir que o proprietário construa o que quiser em seu terreno, o Código Civil impõe como limite os direitos dos vizinhos. Isso significa que a obra não pode causar prejuízo ou incômodo excessivo à propriedade vizinha.
Entre os principais exemplos de situações em que o direito dos vizinhos pode ser violado, podemos citar:
Invasão de espaço aéreo ou subterrâneo (art. 1.299 c/c art. 1.229);
Obstrução da ventilação, insolação ou vista de edificações vizinhas (art. 1.301 a 1.303);
Escoamento indevido de águas pluviais para o terreno ao lado (art. 1.288);
Instalação de janelas ou aberturas voltadas diretamente para o imóvel vizinho sem observar os recuos legais (art. 1.301);
Excesso de barulho, poeira, vibrações ou outras interferências prejudiciais à convivência.
Esses aspectos são regulados em outros dispositivos do Código Civil que complementam o artigo 1.299, formando um conjunto de regras conhecido como direito de vizinhança.
Na prática, se uma construção afeta negativamente o imóvel ao lado, o vizinho prejudicado pode exigir a reparação dos danos ou até mesmo a modificação ou paralisação da obra. O respeito mútuo entre vizinhos é, portanto, uma regra de convivência e uma exigência legal.
3. O cumprimento dos regulamentos administrativos
O segundo limite imposto pelo artigo 1.299 refere-se aos regulamentos administrativos. Isso envolve todas as normas estabelecidas pelo poder público municipal, estadual ou federal que tratam da construção civil e do uso do solo.
Entre essas normas, as mais importantes são:
Plano Diretor Municipal;
Código de Obras e Edificações;
Lei de Zoneamento Urbano;
Regras sobre altura máxima permitida, recuos, taxa de ocupação e coeficiente de aproveitamento do terreno;
Legislação ambiental, quando aplicável;
Regras sobre preservação de imóveis históricos ou áreas de proteção.
Ou seja, antes de construir, é essencial que o proprietário consulte a legislação local e obtenha todas as autorizações necessárias, como o alvará de construção e a aprovação do projeto pela prefeitura. Ignorar essas exigências pode resultar em multas, embargos da obra ou até em demolição.
Importante observar que essas normas variam bastante de cidade para cidade. Por isso, um projeto viável em um bairro pode ser proibido em outro, a depender da zona urbana em que o terreno está localizado.
4. Responsabilidade por danos causados
Mesmo que uma construção esteja regular perante a lei, ela não pode causar prejuízo ao vizinho. Se isso acontecer, o proprietário é obrigado a indenizar os danos, conforme prevê o artigo 927 do Código Civil. Essa responsabilidade é objetiva nos casos em que a obra apresenta risco, como em construções de grande porte ou que envolvam fundações profundas.
Além disso, obras mal executadas podem causar desabamentos, rachaduras em imóveis vizinhos, infiltrações, barulho excessivo e outros transtornos. Nestes casos, o vizinho prejudicado pode buscar reparação na Justiça, inclusive com pedido de paralisação da obra.
5. Boas práticas ao construir
Para evitar problemas legais e manter uma boa convivência com os vizinhos, recomenda-se que o proprietário:
Contrate profissionais habilitados (engenheiros e arquitetos);
Regularize o projeto junto à prefeitura;
Comunique os vizinhos sobre o início da obra, principalmente quando houver escavações ou movimentação de terra;
Observe as normas técnicas da ABNT e as regras de segurança do trabalho;
Respeite os limites do terreno e mantenha os recuos exigidos;
Evite excessos que possam gerar ações judiciais ou sanções administrativas.
Lembre-se: construir com responsabilidade é garantir segurança, valorizar o patrimônio e preservar relações harmoniosas.
6. Considerações finais
O artigo 1.299 do Código Civil reconhece o direito do proprietário de construir em seu próprio terreno, mas estabelece dois limites fundamentais: o respeito aos direitos dos vizinhos e o cumprimento das normas administrativas. Na prática, isso significa que não se pode construir de qualquer jeito, sem planejamento ou sem considerar o impacto da obra sobre o entorno.
Essa regra, embora pareça simples, é o alicerce para a convivência equilibrada entre propriedade privada e interesse coletivo. É por meio dela que o direito de construir se realiza de forma responsável, sem comprometer a ordem urbana, o bem-estar da vizinhança e a segurança das edificações.
Se você pretende construir, reformar ou ampliar seu imóvel, procure sempre um advogado especialista e profissionais da área técnica. Essa é a melhor forma de garantir que sua obra seja segura, legal e esteja protegida contra eventuais disputas futuras.
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