Construções Irregulares do Vizinho, o que fazer?
- Thales de Menezes
- 8 de mai.
- 5 min de leitura
Atualizado: 25 de ago.

O convívio entre vizinhos, especialmente em áreas urbanas densamente ocupadas, exige equilíbrio entre o exercício do direito de propriedade e o respeito aos limites legais que garantem a harmonia da vizinhança, o que se torna um problema em caso de Construções Irregulares do Vizinho. Dentro desse cenário, o artigo 1.302 do Código Civil se destaca por regular situações em que um proprietário descobre, já depois de concluída a construção do vizinho, que houve desrespeito a limites estabelecidos pela legislação civil — especialmente no que diz respeito à abertura de janelas, sacadas, terraços ou goteiras sobre o seu imóvel.
O artigo traz uma proteção ao direito do proprietário de não ter sua privacidade invadida ou sua propriedade prejudicada por construções indevidas, ao mesmo tempo que impõe prazos e consequências jurídicas importantes. Acompanhemos o texto legal:
Art. 1.302. O proprietário pode, no lapso de ano e dia após a conclusão da obra, exigir que se desfaça janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio; escoado o prazo, não poderá, por sua vez, edificar sem atender ao disposto no artigo antecedente, nem impedir, ou dificultar, o escoamento das águas da goteira, com prejuízo para o prédio vizinho. Parágrafo único. Em se tratando de vãos, ou aberturas para luz, seja qual for a quantidade, altura e disposição, o vizinho poderá, a todo tempo, levantar a sua edificação, ou contramuro, ainda que lhes vede a claridade.
Este texto tem por objetivo explicar, em linguagem acessível e técnica, os principais aspectos desse artigo, orientando tanto proprietários quanto profissionais da construção civil sobre seus direitos e obrigações quando o assunto são obras vizinhas que interferem no imóvel próprio.
Direito de exigir a remoção da construção indevida
O caput do artigo 1.302 estabelece um prazo de “ano e dia” para que o proprietário do imóvel prejudicado tome providências contra janelas, sacadas, terraços ou goteiras que tenham sido construídos sobre seu prédio, de forma a ferir as regras previstas no artigo 1.301 do Código Civil, que trata dos limites de proximidade entre aberturas e a divisa do terreno vizinho.
Esse prazo, conhecido como ano e dia (ou 1 ano e 1 dia), começa a contar a partir da conclusão da obra. Dentro desse período, o proprietário lesado pode exigir judicialmente ou extrajudicialmente a demolição, modificação ou retirada da construção que invade sua privacidade ou prejudica seu imóvel.
Por exemplo, se o vizinho construiu uma sacada a apenas 50 cm da sua propriedade, violando o limite mínimo de 1,5 metro previsto no artigo 1.301, o proprietário pode, dentro de ano e dia, exigir a retirada dessa construção. O mesmo vale para janelas com visão direta para o interior do imóvel ou goteiras que despejam água diretamente sobre o telhado ou parede do prédio vizinho.
Perda do direito após o prazo legal
O artigo é claro ao estabelecer que, decorrido o prazo de ano e dia, o proprietário não poderá mais exigir a retirada da janela, varanda, terraço ou goteira construída em desacordo com a lei. Nesse caso, a construção se consolida pela inércia do vizinho, criando uma situação jurídica de estabilidade.
Mas essa consolidação vem acompanhada de um ônus para o proprietário prejudicado: ele não poderá, por sua vez, edificar de forma que prejudique a construção anterior. Ou seja:
Não poderá fechar a goteira do vizinho, prejudicando o escoamento das águas;
Não poderá construir de forma a impedir a continuidade do uso da sacada, janela ou terraço já existente, se isso causar dano ou tornar inviável o uso do que já foi consolidado.
Em termos práticos, isso significa que a omissão dentro do prazo legal impede reações posteriores. O proprietário lesado perde o direito de reclamar e passa a ter o dever de respeitar a situação consolidada.
Exceção para aberturas de luz (parágrafo único)
O parágrafo único do artigo 1.302 trata de uma situação específica e importante: as chamadas aberturas para luz, ou seja, pequenas janelas ou vãos utilizados para entrada de claridade natural, que não têm finalidade de observação nem permitem vista para o imóvel vizinho.
Nesses casos, mesmo que tais aberturas estejam em conformidade com o artigo 1.301 — como vãos com até 10 cm por 20 cm de dimensão, colocados a mais de dois metros do piso — o proprietário do terreno ao lado pode, a qualquer tempo, construir um muro ou levantar uma edificação que bloqueie a entrada de luz.
Isso significa que não há direito adquirido à luz natural vinda do terreno vizinho, quando se trata dessas pequenas aberturas. O dono do imóvel vizinho pode construir livremente, ainda que isso venha a vedar completamente a claridade que antes iluminava o imóvel do outro.
Esse dispositivo protege o direito de construir do vizinho, reafirmando que as aberturas para luz não criam servidão nem impedem o exercício da propriedade plena sobre o terreno ao lado.
A importância de agir dentro do prazo
O prazo de ano e dia funciona como uma espécie de prazo decadencial, ou seja, um limite legal fixo para o exercício do direito de reclamar. Se o proprietário perceber a construção irregular do vizinho e não se manifestar dentro do prazo, ele não poderá mais contestar judicialmente a situação, e a edificação se torna juridicamente protegida contra futuras reclamações.
Isso reforça a importância de acompanhar as obras vizinhas e, diante de qualquer indício de invasão de privacidade ou prejuízo ao uso do próprio imóvel, procurar orientação técnica e jurídica imediatamente.
Relação com o artigo 1.301 e outras normas do Código Civil
O artigo 1.302 complementa o artigo 1.301, que determina os limites mínimos para construções na divisa dos imóveis, especialmente quanto a janelas, terraços, eirados e goteiras. Enquanto o artigo 1.301 trata de prevenção e limites na construção, o artigo 1.302 trata de como reagir após a obra já estar concluída.
Além disso, a norma está em consonância com outros princípios do Código Civil, como:
Função social da propriedade (art. 1.228, §1º);
Proibição do abuso de direito (art. 187);
Respeito à vizinhança e ao sossego, segurança e salubridade (art. 1.277 e seguintes).
Portanto, qualquer construção que extrapole os limites legais ou cause prejuízo ao vizinho pode ser contestada — desde que se respeite o prazo previsto no artigo 1.302.
Outros pontos
Esse tema gera repercussão em vários outros pontos do direito brasileiro, eu explico um pouco melhor sobre ele no seguinte artigo, que também possui um vídeo no texto, confira: "Problemas com Reformas e Obra do Vizinho"
Conclusão: Construções Irregulares do Vizinho
O artigo 1.302 do Código Civil é uma ferramenta fundamental para garantir o equilíbrio entre o direito de construir e o respeito à propriedade alheia. Ele estabelece um prazo de ano e dia para que o proprietário reaja contra janelas, varandas, terraços ou goteiras construídas sobre seu imóvel em desacordo com a lei.
Após esse prazo, a construção se consolida, e o proprietário perde o direito de exigir a retirada da obra, devendo inclusive respeitar a nova situação. Por outro lado, quando se trata apenas de aberturas para luz, o vizinho tem total liberdade para edificar, ainda que bloqueie a claridade.
Por isso, é essencial que o proprietário esteja atento a qualquer construção que interfira em seu imóvel. E, diante de qualquer irregularidade, busque auxílio técnico e jurídico o quanto antes. O direito de agir é garantido por lei, mas tem prazo para ser exercido. Deixar passar o tempo pode significar a perda definitiva da possibilidade de proteger sua propriedade.
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Advogado imobiliário em Goiânia (Goiás) é Thales de Menezes.




